Este Blog foi um programa de rádio The Steadfast Tin Soldier: Anonimato: tecnologia e sociedade

terça-feira, fevereiro 20, 2007

 

Anonimato: tecnologia e sociedade

Antes de mais, cabe-me explicar a minha ausência destas lides da blogo-esfera. Não sei se lhe poderei chamar ausência, já que não houve propriamente permanência ou presença, dado que este blog tem apenas um artigo da minha autoria...digamos que tenho tido uma participação nómada, como convém a selvagens como eu. A explicação da minha ausência é muito simples: desastrada como sou, consegui levantar-me do sofá, tropeçar nos fios que ligavam o portátil à corrente eléctrica (sem cair, pois, mesmo no limiar da tragédia, há que manter a dignidade) e eis que o meu estimado computador dá um real mergulho no soalho da minha sala. Nunca mais deu sinais de vida e eu, em solidariedade com ele, também não. Acabado o meu período de nojo, volto então às já mencionadas lides da blogo-esfera.

Pensei escrever sobre o anonimato, porque é, de facto, um tema que me interessa e que penso que interessará cada vez mais à sociedade desta [cada vez mais] aldeia global. Aviso, desde já, que não escreverei nada que eventuais leitores não saibam ou em que já não tenham pensado. É apenas uma reflexão light (este nojento anglicismo, tão em voga, até fica aqui bem) ou ligeira, para os mais puristas. Anonimato sempre houve, desde que há autores. Nem sempre o anonimato é voluntário, já que abundam obras de autor desconhecido em qualquer cultura (que não parecem provir de qualquer intenção manifesta de ocultar a assinatura), sobretudo se ficcionarmos um recuo secular.

Não é, contudo, de séculos idos que me proponho dissertar. A banalização do telemóvel e da Internet ocorreu de uma forma tão avassaladora que, actualmente, qualquer deles se tornou uma necessidade básica, se não para a maioria dos cidadãos individualmente considerados, é certo que a sociedade depende destes novos meios de informação e de comunicação. Ora, esta democratização tornou-nos a todos potenciais “anónimos voluntários” e potenciais vítimas de “anónimos voluntários”. Se qualquer um de nós já recebeu mensagens ou telefonemas anónimos que, mais tarde ou mais cedo, descobriu não ter passado de uma brincadeira de um amigo ou conhecido, a verdade é que existem casos em que essa sorte não existe. Nem sempre os telemóveis e a Internet estão nas melhores mãos. Se uns escrevem mensagens ou fazem telefonemas de conteúdo pessoal, ofensivo ou jocoso, outros dedicam blogs ou fazem comentários a textos protegidos por pseudónimos ou pelo anonimato. É claro que, se nuns casos, estes “artifícios” são absolutamente inofensivos, noutros contêm intenções muito pouco ortodoxas. Não sou fundamentalista ao ponto de achar que os telemóveis e a Internet são coisas vis, aliás, contra mim falaria, já que escrevo (ou, melhor, vou escrevendo) em blogs e tenho telemóvel, que não dispenso por variadíssimas razões. Simplesmente, assusta-me o mau uso das mesmas tecnologias.

As sociedades das grandes metrópoles, que acompanharam a fragmentação da família enquanto instituição legalmente protegida, são extremamente individualistas. Já não se habita em extensão, mas sim em altitude, o que dificulta os contactos entre vizinhos; os horários de trabalho obrigam à rotina dos transportes públicos, onde só o contacto visual é incomodativo (porquê, se quase todos estamos sós?); ao fim do dia, quem vive sozinho, regressa a casa nas mesmas condições em que dela saiu – cansado da vida urbana, dos ruídos da cidade, carente e, novamente, repetidamente, rotineiramente, só. Onde é que eu quero chegar com isto? É simples! A solidão e o desejo secreto de companhia potenciam a vontade de comunicar, vontade essa que pode redundar em magoar, em chatear, em gozar o alheio ou em tornar-se vítima das más intenções alheias. Nem sempre as vantagens do anonimato são utilizadas por pessoas normais (sim, há casos patológicos que podem tornar uma comunicação aparentemente inofensiva em algo perigoso, desaconselhável e inconveniente) ou bem intencionadas. É possível cometer-se vários delitos, puníveis legalmente, com a má utilização destes meios de comunicação. E vai punir-se quem? O tempo que demora descobrir de quem se trata, o andamento de um processo judicial (sim, porque, muitas vezes, há matéria para tal), depoimentos, testemunhas, sentença, horas, anos perdidos … para quê? Compensará? Ou o melhor será votar a história ao esquecimento, sem consequências para o “anónimo”?

É caso para dizer: “Eles andam aí”.

Comments:
É uma das desvantagens associada à enorme vantagem que é a evolução da comunicação. Qualquer pessoa hoje em dia se pode fazer passar por outra. Não é difícil.
Recebi há uns tempos um e-mail sobre um polícia qualquer que se fazia passar por um rapaz de 14 anos para ir alertar uma rapariga acerca destes perigos - sinceramente, acho que o e-mail era falso. Mas a "moral da história" estava presente! Pus-me a pensar: não custa nada forjar uma identidade... Umas fotografias que se tiram daqui e dali, cria-se um Hi5 (e hoje em dia quase que se toma por garantida a existência de uma pessoa apenas pela simples existência de um perfil no Hi5...), um e-mail, aparece-se de vez em quando no MSN, enviam-se uns mails, umas fotografias (nossas ou de outra pessoa qualquer) e criámos uma identidade totalmente nova!
Lembro-me de um amigo no 7º ou no 8º ano, nos bons velhos tempos do mIRC, me explicar que conseguia fotografias de raparigas entrando no canal lésbicas e fazendo-se passar por rapariga. Nessa altura não havia Hi5, penso eu, não existiam "imagens de apresentação" como no MSN, não existia um profile que se pudesse visitar... Baseava-se tudo numa questão de "acreditar na palavra do outro", costume esse que está a cair em desuso numa sociedade que tristemente vejo ser corrupta, oportunista e "sacaninha".
Os telemoveis, idem. Sei do caso de um aluno que passou a enviar mensagens anónimas a uma professora, ameaçando-a. No entanto, o *CON# só funciona aquando da recepção da mensagem - os registos de envio ficam guardados na operadora, daí ser relativamente fácil apresentar uma queixa. Mesmo com essa facilidade relativa, o truquezinho do *CON# não deixa de provocar situações que, não sendo suficientemente graves para agir legalmente contra essa pessoa, são bastante chatas - o mais chato é que é o próprio manual do telemóvel que contém as instruções para enviar mensagens anónimas.
Não tenho mais nada a dizer, I think... Keep it up! =)
E não penses que a tua ausência não foi sentida (tome-se como prova disto o comentário do Lion no "Farturas e pipocas") - mesmo não tendo havido uma permanência (mas houve presença, of that I'm sure...), sentiu-se, sem dúvida, a tua ausência. Espero que abandones (ou, pelo menos, reduzas ;) esse teu estilo nómada. Welcome back! :) Desta vez ficas? I hope so! =)
 
adorei este post, gostava tanto de ouvir mais pessoas com opiniões semelhantes
 
Antes de mais, como o João Pedro salientou, a tua presença foi severamente sentida, como sentimos todos pelo teu pobre computador portátil, que poderá já ter tido dias melhores (estou certo?!). Já agora, se serve de consolo, sei por experiência própria que esse tipo de tragédias acontece aos melhores (digo "melhores" num acesso de humildade que, como é sabido, é uma das minhas inúmeras virtudes... E aqui está um plágio descarado de uma frase clássica, de um autor que ninguém conhece... Acho eu...).
E agora, aproveitando esta subtil mudança de assunto, vamos ao tema:
É verdade que, se já antigamente assim se passava, com a globalização (esse processo tão destrutivo quanto construtivo), a importância do anonimato tornou-se quase extrema.
Somos aconselhados a mantê-lo durante as nossas conversas cibernéticas forçando, por vezes, a falta de sinceridade.
Se o anonimato pode aparecer como agressão e atentado à segurança (um bem tão essencial e escasso, na nossa sociedade), também é verdade que pode significar a mesma segurança, sendo nossa a sua utilização.
Ouvidas e, principalmente, lidas, histórias (falsas ou verdadeiras) de raptos e outros exemplos do "mau anonimato", torna-se uma constante conhecer pessoas simples e "inocentes" (entre "s, pois ninguém que possa raciocinar por si próprio poderá ser considerado realmente inocente) que, como nós, temem estar a trocar palavras, sentimentos e tempo com algum homem de 50 anos, fechado numa base escura, onde guarda os instrumentos que usa no tráfico de órgãos (ou alguém tão ou mais perigoso para [mais uma vez] a nossa segurança).
Inventam-se idades, caras, corpos, nomes... Inventam-se identidades.
Mais do que a nossa sociedade, é o nosso mundo... Imperfeito como foi, é, e sempre será!
Fica bem!... E porta-te mal!
Peace ;p
 
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