Este Blog foi um programa de rádio The Steadfast Tin Soldier: Palhacinhos, O Pequeno Polegar

sábado, dezembro 23, 2006

 

Palhacinhos, O Pequeno Polegar

Ontem à noite fui assistir a uma ópera infantil chamada Pollicino (O Pequeno Polegar), de Hans Werner Henze. A razão para o "palhacinhos" é simples: muitas das crianças (já sei que vou receber alguns comments a reclamar sobre isto das "crianças"... ;-P) que participam na ópera são alunos do IGL, e o Prof. Armando decidiu dar-lhes a carinhosa alcunha de Palhacinhos... Palhacinhos, Pollicino... You get the point...
Ora bem, estava eu a dizer... Fui ver uma ópera infantil, e gostei! É giro, embora não seja propriamente algo para a minha idade. No entanto, houve algo que me deu um enorme gozo, e que não foi o facto de ter visto a Laura vestida de Senhor Mocho com um fato semelhante a um ovo Kinder e umas patas que pareciam ter sido arrancadas ao Poupas Amarelo, nem o facto de o Afonso estar vestido de Senhor Lobo (Mau) e cantar extensas e complicadas árias como "Pois..." e "Palavra de Lobo...", nem o facto de um dos putos não conseguir tirar parte do fato de esquilo na altura dos agradecimentos, nem o facto de o Senhor Ogre não saber cantar, nem sequer o facto de a Leonor ter guinchado "Vamos brincar às escondidas!" no meio do palco. O que deve ter sido bastante constrangedor, porque ela teve que continuar em palco e enfrentar as caras daquelas crianças tão cruéis, autênticos carrascos de 8 anos. O que me deu mais gozo foi entrar na sala MEEESMO antes de o espectáculo começar, quando a orquestra já estava no fosso (LOL esta expressão tem piada...), e ver imensas crianças à volta do fosso de orquestra. Se calhar era só a infantil curiosidade de ver aquelas pessoas lá em baixo, vestidas de preto, com instrumentos na mão, mas a minha inocência levou-me a pensar que seria por estarem interessadas na música. Não era. O que me agradou foi mesmo ver tantas crianças numa ópera infantil. Mesmo infantil, é ópera, é música, e quase aposto que pelo menos uma daquelas crianças que lá estavam vai, um dia, estudar música "a sério" e vai, pelo menos, considerar seguir uma carreira como músico.
Há também um lado de crítica social presente na obra. Recordo-me de duas situações: a primeira, quando o pai de Pollicino diz algo como "os patrões não cumprem nada do que prometem, tal como algumas pessoas que todos nós conhecemos". (Está tudo dito, não está? Para crianças de 7 ou 8 anos, talvez não...) A segunda situação está muito bem disfarçada: quando Pollicino e as suas irmãs são apanhados em casa do Ogre, sentam-se à mesa para jantar e engordarem, para que este as possa comer. Pollicino senta-se junto ao Ogre, e há uma altura em que este lhe toca na perna. Pollicino afasta-se e o Ogre começa um recitativo em que diz "Estou farto de passar a vida a comer crianças..."
Além desta vertente de crítica social, a ópera teve um carácter claramente político. O autor, Hans Werner Henze, era um militante de esquerda, e isso reflecte-se em Pollicino: o Ogre simboliza a institucionalização (um Ogre sindicalizado, que recebe telefonemas de pessoas importantes para combinar jantaradas com outros "grandes", como o Terrível e o Diabo) e o fascismo, contra o qual não se pode lutar. Outro símbolo do fascismo é, segundo o Nuno, o dono das terras onde trabalhavam os pais de Pollicino - a classe operária, o povo oprimido - que não lhes paga mas exige o trabalho; há um diálogo curioso, logo no início da ópera, em que a mãe de Pollicino pergunta ao pai porque é que não vai pedir o dinheiro ao dono das terras, e este responde que, se o fizer, não o deixarão mais trabalhar nas suas terras: é a obrigação do povo, a escravização do proletariado, o triunfo da classe imperialista sobre a classe trabalhadora, "manda quem pode, obedece quem deve". Pollicino representa, naturalmente, a revolução contra o estado totalitário e a emancipação dos oprimidos; a cena da passagem do rio com as filhas do Ogre simboliza o triunfo do socialismo e a libertação do povo da escravatura. Assim, temos em duas personagens centrais (Pollicino e o Ogre), segundo a teoria marxista, as classes fundamentais de uma sociedade capitalista. Uma outra prova da orientação de esquerda presente nesta peça é o desfecho: Pollicino e os irmãos, não matam o Ogre fascista e roubam o dinheiro que levarão aos pais e, assim, com o dinheiro do Ogre, ficarão ricos e nunca mais abandonarão os filhos... Não! Isto, além de violento, é um comportamento capitalista, cujas intenções finais são enriquecer à custa de terceiros. Em Pollicino, o herói e as suas irmãs, assim como as filhas do Ogre que fugiram de casa, atravessam a floresta e deparam-se com um rio difícil de atravessar. No entanto, com a ajuda uns dos outros, atravessam o rio e, como por magia, as filhas do Ogre (pequenas "ogras") transformam-se em meninas normais. O cenário modifica-se e a tempestade que se abatia sobre o grupo de heróis revolucionários dá lugar a uma Primavera florida, em que todos cantam uma música de intervenção cuja letra inspira confiança no futuro, de punho esquerdo fechado e erguido, t-shirts vermelhas com a cara do Che Guevara e bandeiras do PCP. (Não é bem assim, mas é quase...)
Uma última nota, extraída directamente do programa distribuído à entrada:
Até onde poderia ir sem utilizar as palavras de Henze, que desejava com humor que Pollicino, Clotilde e os seus irmãos "fundassem uma comuna, plantassem tomates e fumassem haxixe"?
P.S. - O Pollicino tem 13 anos.
Avante, Palhacinho, Avante!

Comments:
como desde pequeno (desde que comecei a ter noçao das coisas e conhecer politicas; de facto pequeno e exageradu =P) fui de esquerda, gostu da ideia geral da peça. Embora saiba que pra ti tenha mais interesse o factor musical, e bom saber que se exibem peças mais antigas baseadas nos valores que hoje nao fazem tanto sentido mas que ha umas decadas atras fazia todo o sentido..blog continua optimu, leio sempre! parabens e bom natal pro sr "bloggador" e pa todo o ppl k comenta! =)
 
Olá. Bonito post. João, sabes bem que o melhor do espectáculo foi ver aqui a diva ('Mas olha, ela hoje tá mesmo vestida à diva!') vestida de Ovo Kinder a cantar 'Triste história's e a divertir-se imenso. Obrigada por teres ido! Beijo grande e bom natal, zoão!
 
bernardo: a componente musical era a única que tinha importância no Pollicino... antes de o ir ver! o verbo é mesmo "deliciar": deliciou-me ver uma componente de esquerda tão presente e de uma forma tão engraçada naquela ópera ;)
laura: DIVAAAA!!!!!!!!!!! (by the way... lindas patas! ;P)
laura e bernardo e todos os que lerem isto: feliz natal!!! ;)
 
Sinceramente, acho que se a ópera era para crianças, não vejo muito motivo para ter estes ideais politicos todos... Eu já fiz 5 óperas infantis e acho muito, mas MUITO estranho, para além de estúpido, fazerem-se coisas deste género. O que fiz são coisas como histórias infantis transformadas em ópera, que ainda dão mais magia ao mundo da fantasia, ou então recriação das historinhas que vêm na bíblia (por tudo se passar num colégio jesuíta... BAAAA...).
Se o homem queria mostrar as suas preferências partidárias, nada contra, mas numa ópera para miúdos? Até que podia camuflar mais isso, mas tão expostamente? A infância é para sonhar, e rir, e brincar, não para aprender o grande sonho fascista... Enfim, pelo menos eu não o faria assim...
E já agora, conto um episódio que me entristeceu MUITO, enquanto fazia uma ópera:
A encenadora mandou a orquestra entrar. Nós assim o fizemos. Sentamo-nos, algumas pessoas presentes no público aplaudiram, muitas ainda estavam de pé, mas na primeira fila estava uma mulher, ainda jovem, com o seu filho ao colo... O miúdo não teria mais de 3 anos e como ouviu aplausos começou a bater palmas também. A mãe junta-lhe as mãos e diz como que se estivesse a dizer que o mundo era redondo: "São músicos, filho. Não se bate palmas!"
Enfim... Desejo-te um feliz Natal (e atenção que são 20.06 do dia 24. Isto só para dizer que não me esquci de ti e vim "visitar" o teu cantinho...)
Bjinho, muitas prendas, muito carinho, muita luz...
 
E aqui estou eu de novo a comentar. O Pollicino é uma ópera infantil. Isto pode ser entendido de duas maneiras. É feito por crianças e feito para crianças. Nenhuma das duas é restritiva, de modo que Henze escreveu para muitas crianças e cinco adultos (Ogre, mulher do Ogre, Lenhador, sua mulher e Lobo - sim, era para ser um adulto.), e escreveu uma ópera em que evidenciou as suas ideias de esquerda, mostrando que não é apenas para crianças verem. Além do mais, muitas vezes, mais importantes do que as ideias contra o capitalismo e blábláblá, há ideias muito fáceis de serem entendidas por crianças. Como exemplo disso temos a cena da Floresta, em que se diz que 'o bosque pode ser amigo dos homens se os homens dele forem amigos'. Também temos a eterna ideia do bem ganhar ao mal e do arrependimento dos maus, com o Ogre a dizer 'estou farto de ser ogre, quero levar uma vida simples, estou farto de comer crianças (..) e vamos de férias para sempre..', que acho que encaixa na ideia de dar 'mais magia ao mundo da fantasia'.
Portanto, não vejo qual é a grande estranheza para além de estupidez. Para além de que falar assim sem conhecimento da obra em questão é duro.
O Pollicino - Pequeno Polegar tem ideias de esquerda, sim, tem ideias da infância feliz e tudo acabar bem, sim, teve até agora um público de todas as idades, e continua a ser uma ópera infantil. Beijinhos, João.
 
Ora bem, vamos lá ver uma coisa... Este post está ALTAMENTE exagerado... =P é claro que o Pollicino tem um "cheirinho" a esquerda, mas nem de perto nem de longe é aquilo que eu escrevi! Caramba, isto era uma caricatura gigantesca! =P é claro que nada é associado ao triunfo do socialismo nem à luta contra as classes capitalistas da forma como eu o fiz; era só uma interpretação minha com base nalguns aspectos da obra, mas de uma forma bastante exagerada.
Mais uma coisa... Ana: "A infância é para sonhar, e rir, e brincar, não para aprender o grande sonho fascista..." -> tudo o que a ópera possa ter de político (que não é muito...) é exactamente na orientação contrária: anti-fascismo, e não o grande sonho fascista... =P
E... obrigado por terem passado por cá =) espero que o natal esteja a ser super hiper mega rifixe!!! =P lololol ;P beijinhos***
 
(ups, esqueci-me de comentar isto...)
"São músicos, filho. Não se bate palmas!" -> LOLOLOL estranhos bichos que "nós" somos... (nós entre aspas, porque eu ainda só sou um protomúsico ;P )
"uhhh... músicos... não te aproximes, filhinho, que isso pega-se..." E sabem que mais? Pega-se mesmo! ;)
 
espectacular este post ;P antes de ir ao "palhacinho" ja tinha lido isto, logo foi curioso constatar certos factos, durannte o espectaculo, que aqui tinhas referido.
a acrescentar a tudo o que disseste, so tenho a dizer que o pollicino d'ontem (dia 27) esteve um bocado foleiro na voz. de resto, maravilhoso :)

abraço!
 
UM BOCADO FOLEIRO NA VOZ? Voz de quem? Só se do Mocho, que nitidamente era de pior qualidade. E o Pollicino tambem nao era o melhor dos dois. Mas tirando isso, QUAL BOCADO FOLEIRO HEIN? Ai Andrefe.
 
pois, eu tava-me a referir ao pollicino, o puto! mas tb n se pode exigir mto mais a uma criança daquela idd q enfrenta uma plateia daquele tamanho (a menos q ja esteja habituado). Quanto ao mocho ser de pior qualidade : :P n sei, talvez sim, talvez nao, nao te vi a actuar! a unica coisa que te vi fazer foi arrastar mesas, cadeiras e casas ;P

ai lala... :P
 
"Mesmo infantil, é ópera, é música, e quase aposto que pelo menos uma daquelas crianças que lá estavam vai, um dia, estudar música "a sério" e vai, pelo menos, considerar seguir uma carreira como músico."

eu estive lá, eu sou (quase) uma criança... eu tambem conto?
 
Sim, também contas ;P afinal, és uma menina muito pequenina (LOL note-se o tom irónico... =P ), loirinha, de olhos azuis e cabelo encaracolado que usa lindos vestidos azuis com florinhas cor de rosa e amarelas... ;) lol
P.S. - Alguém está a imaginar a ana assim? =P lolol
 
o mocho de dia 21 e 27 foi o melhor!!! :P
e andou a arrastar mesas e cadeiras no dia em que tu foste! :P e tambem espreitou para o fosso da orquestra com uns fatos que mais pareciam pijamas e com umas trancinhas lindas! LOOL
 
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