quarta-feira, outubro 29, 2008
Diário de um produto do nosso sistema de ensino
«
29 de Junho de 2009
29 de Junho de 2010
29 de Junho de 2011
29 de Junho de 2013
29 de Junho de 2014
29 de Junho de 2015
29 de Junho de 2016
29 de Junho de 2017
29 de Junho de 2019
29 de Junho de 2021
29 de Junho de 2023
29 de Outubro de 2023
29 de Agosto de 2029
sábado, outubro 04, 2008
Le Nozze di Giovanni Tito, re di Creta, et Bastienne, la Finta del Cairo, aus dem Serail in Alba
A minha contribuição para o aumento do conhecimento musical tanto dos caloiros como de outros visitantes deste blog que se interessem pelo assunto passa por uma pequena abordagem à história da ópera, com especial destaque para as óperas de Mozart. Para tal, exemplificarei com uma única ópera todas as características do género operático Mozartiano. So, here it is:
A ópera foi inventada pelos gregos, isso é ponto assente. A tragédia grega começou, tal como o cinema, por ser muda, sem palavras. Seguidamente adquiriu falas e diálogos e, posteriormente, foi introduzida música - primeiro instrumental e depois vocal. A música vocal era constituída principalmente por lieder em honra do deus Dionísio (daí a música vocal ser considerada música dionisíaca) chamados Ditirambos. No início eram apenas solistas, em árias e recitativos, mas depois surgiu o conceito de coro - do grego choros -, de que é exemplo o famoso coro da tragédia grega que transmitia ao público os pensamentos e emoções que os actores não podiam expressar por palavras. Quando Aníbal invadiu Atenas, montado naquilo que era ainda um animal desconhecido para os povos do Ocidente - o elefante -, as suas manadas derrubaram um teatro grego onde, na altura, estava a ser exibida uma peça, tendo espezinhado os cantores do coro - daí advém a designação coro spezzato.
Durante a Idade Média a ópera permaneceu adormecida, só tendo voltado a surgir durante o período Barroco, com Bach. Na Paixão Segundo S. Mateus, escrita em 1727, Bach recupera o conceito operático grego com a inclusão do recitativo secco (i.e. acompanhado unicamente pelo baixo contínuo ao cravo ou pianoforte), a ária e o arioso. Verifica-se também uma evolução na definição das formas musicais, com a presença da forma-sonata, claramente tripartida, bem definida nos vários andamentos da ópera, com muitos dos temas da exposição, cantados pelos personagens, a serem repetidos pelos violinos durante a reexposição.
Embora a ópera esteja marcadamente presente durante o período da Antiguidade Clássica e o Barroco, não é senão durante o Classicismo que se dá o grande boom operático. Surge a divisão teórica entre os dois estilos: a opera seria, trágica ou dramática é representada sobretudo nas cortes e é definida por uma temática séria e austera, dotada de uma complexa estrutura narrativa e, à boa maneira da mentalidade do Classicismo, abordando temas como o misterioso, o sagrado, o religioso e o mitológico - p. ex. A Flauta Mágica, de Mozart. Do lado oposto temos a ópera cómica, buffa, ópera comique ou tragicomédia, de carácter burlesco e temáticas levianas, destinada a ser representada nos vários teatros de ópera existentes nas grandes cidades. As linguagens utilizadas são, predominantemente, o italiano e o alemão, de forma a que o povo (iletrado) possa perceber o que se passa em palco, o que não aconteceria se a ópera fosse cantada em latim como acontece com a opera seria.
Mozart foi o apogeu da ópera no Classicismo, tendo escrito 22 óperas. Todas elas foram, sem excepção, obras de maturidade e alcançaram, por isso, um enorme sucesso que se revelou intemporal já que todas as 22 óperas se mantêm ainda hoje no repertório operático internacional.
O estilo de Mozart foi bem explicitado numa das suas óperas, sendo que todas as características pessoais e de época estão concentradas numa só obra. O título, conhecidíssimo, é As Bodas de Fígaro:
O cenário é o castelo do Conde Almaviva. Fígaro e Susanna são servos do conde e estão noivos, embora o nobre mantenha uma longa história de assédio sexual a Susanna sem que Marcellina, a sua mulher, desconfie.
Acto I
No seu futuro quarto, Fígaro tira medidas e escolhe, de um livro, a mobília que irá encomendar, entoando a famosa "ária do catálogo". Susanna prova um chapéu para usar na boda. Fígaro expressa toda a sua felicidade por, após o casamento, ir receber do pai de Susanna, o Paxá Selim, como dote, dois servos: Pedrillo e Blondchen. Canta, para festejar o fim da sua vida de servo e o início de uma nova vida como senhor, a conhecida ária Notte e giorno faticar. No entanto, Susanna previne-o que o seu pai não pretende cumprir a promessa, uma vez que Fígaro e Susanna seriam obrigados a continuar a servir o Conde Almaviva que, um ano antes, tinha apunhalado a esposa do Paxá Selim, Marquesa Violante Onesti, também sua amante [do Conde]. Fígaro discorda, pois sabe que o Paxá Selim já foi prisioneiro de guerra do seu pai, Don Giovanni, e que se considerará eternamente em dívida para com a família de Fígaro devido à clemência de seu pai. Sonhador, Fígaro canta, juntamente com o coro dos janíssaros, a famosa passagem coral Va, pensiero, sull'ali dorate. Susanna entra num momento de introspecção e levantam-se dúvidas sobre a fidelidade de Fígaro, pelo que vai desabafar com a sua confidente Despina, que entretanto entrou em cena para fazer algumas limpezas. Esta avisa-a que nenhum homem é fiel, e que deverá habituar-se a esse tipo de vida, porque "todos procedem da mesma maneira" - Despina canta a ária Così fan tutte. Despina e Susanna saem de cena e entra Leporello, amigo de Fígaro, a quem este último confessa que tem sido assaltado por algumas dúvidas acerca da fidelidade de Susanna. Leporello tranquiliza-o e diz-lhe que Susanna não sabe sequer o que é a traição: Susanna é como uma ovelha mansinha, mas o importante é retirá-la de círculos com más influências por parte de outras mulheres - figurativamente, "as cabras", referindo-se a Despina. Canta a ária Inter oves locum presta et ab hædis me sequestra. Saem de cena.
Entram Despina e Tito Vespasiano, a quem Despina explica que emprestou dinheiro a Fígaro sob a condição de, se este não conseguir pagar, ter de casar com ela, numa forma de se vingar de Susanna, que secretamente odeia desde criança, quando Rigoletto, um namorado de infância, trocou Despina por Susanna. Tito Vespasiano, interessado em obter algum dinheiro, consente em ajudar Despina a casar com Fígaro se esta o ajudar a ganhar uma aposta em como tanto Fígaro como Susanna são infiéis. Fígaro e Leporello voltam a entrar em cena e Tito aproveita e dirige-se a eles propondo-lhes, individualmente, que Fígaro tente seduzir Despina para que não precise de lhe pagar e depois não se case com ela, e que Leporello tente seduzir Susanna, por quem sempre sentiu uma profunda atracção. Os dois aceitam e, aproveitando a desculpa de um barco de Belmonte Lostados que parte para resgatar Konstanze do harém do Paxá Selim, Leporello veste-se de Cherubino e Fígaro de jardineira.
Em cena fica apenas Despina, a quem se junta agora Susanna. Susanna confessa-lhe que, ocasionalmente, tem pensamentos eróticos com Leporello, o que leva Despina a esfregar as mãos de contente. Entra, neste momento, Leporello vestido de Cherubino, pagem do Conde Almaviva, que vem proclamar o seu amor por Susanna, Despina, Marcellina, Konstanze, Marquesa Violante Onesti, Blondchen e todas as mulheres do mundo. Fígaro, vestido de jardineira, escuta atrás da porta e entra também, declarando-se a Despina na tentativa de a levar a não cobrar a dívida. Entra o Conde Almaviva que, através de uma carta anónima, tomou conhecimento da dívida de Fígaro e informa Susanna, que se retira lavada em lágrimas. Chega então o Paxá Selim acompanhado de Pedrillo e Blondchen, que pretende entregar a Fígaro. Ao ver o Conde Almaviva, reacende-se a discussão sobre a defunta Marquesa Violante Onesti. O Conde Almaviva canta a ária Der Hölle Rache kocht in meinem Herzen e chama o seu lacaio, Osmin. Alertado pela barafunda, entra novamente Tito Vespasiano. Entra também Papageno que, tendo-se enganado na ópera, sai pela janela. Seguidamente chega Antonio, o jardineiro alcoólico, que jura ter visto um pássaro com tamanho de homem a saltar pela janela. Chega também a Rainha da Noite, irmã de Despina, totalmente rebentada de mais uma noite a trabalhar no Elefante Branco. Entra então o sacerdote, Sarastro, que informa o Conde Almaviva da trama de Tito Vespasiano. Sabendo que tirará proveito daquela situação, o Conde Almaviva desmascara Fígaro e Despina pensa que este estava realmente interessado nela, pelo que o abraça imediatamente. Entra, então, Susanna, que entretanto tinha pedido dinheiro à mulher do Conde, Marcellina, para ajudar a pagar a dívida de Fígaro. Ao vê-lo abraçado a Despina, julga que este quebrou a promessa de casamento e atira-lhe com o dinheiro num acesso de raiva, como pagamento pelos seus "serviços" enquanto estavam juntos, cantando Questa donna conoscete?, seguindo-se a repreensão do coro com Di donna ignobile insultatore.
Entretanto chega ainda Marcellina, que não faz a mínima ideia do que se está a passar, e por isso pergunta a Idomeneo, rei de Creta, o que está a acontecer, mas este responde que acabou de chegar e também ainda não sabe nada... Os ânimos exaltam-se e o Conde Almaviva tenta bater no Paxá Selim, mas falha e acerta na esposa, Marcellina, que tomba para cima de Idomeneo, desfalecida. Ao aproximar-se da esposa, o Conde desequilibra-se e rola contra os pés de Pedrillo, que cai e arranca a saia a Blondchen. Isto leva a que Leporello/Cherubino, que proclama o seu amor por todas as mulheres, se atire para cima de Blondchen, tropeçando no Paxá Selim e caindo contra Osmin que se desequilibra e cai, esmagando o pé de Idomeneo. Susanna lança um grito histérico que toda a gente ignora, Fígaro boceja mas logo leva um calduço de Sarastro. Entretanto alguém vai dar com a Rainha da Noite e o jardineiro alcoólico a comerem-se numa casa de banho. Chegam, entretanto, as Valquírias, amigas da Rainha da Noite, que as convidou para uma orgia cavalgante com o jardineiro.